Rua do Ouvidor:
Histórias e Curiosidades da rua mais famosa do centro!
Rua do Ouvidor -Início do Século XX - Fonte: Rio Antigo |
Este
novo Artigo foi escrito com o intuito de mostrar aos leitores como apenas uma
rua pode ser cheia de histórias e fofocas históricas. A Rua do Ouvidor é motivo
de grande orgulho para todos os cariocas. Este Artigo também serviu de base
para o documentário que participei sobre o mesmo assunto.
Fonte: Rio Antigo |
PALAVRAS CHAVES
Rua
do Ouvidor – Imperador - Igreja
O INÍCIO DA RUA DE "MIL" NOMES!
Falar
da nobre Rua do Ouvidor é remeter ao Rio de Janeiro antigo, em uma época na
qual a cidade ainda estava em formação, uma cidade recém-fundada (1565) que
tinha montado sua sede de Governo no Morro do Castelo. Vamos transportar nossas
mentes ao ano de 1574: o governador da pequena cidade era Cristóvão de Barros (1573-1575), uma área ainda bem
selvagem, com poucas casas e ruas abertas, quase sem condições de viver. É
dessa data (1575) nos registros históricos que
aparece pela primeira vez a rua, que na época se chamava Rua Desvio do Mar,
devido ser a única rua em cujo final fazia exatamente essa função: desviar do
Mar. Para muitos historiadores, é considerada a rua transversal mais antiga de
nossa cidade. Era uma rua simples, de terra e com poucas moradias. O maior
número de pessoas residia aos redores do Morro do Castelo, onde temos ruas que
já não existem mais, como a Rua da Misericórdia.
Mas
ainda no século XVI vamos ver a primeira de muitas mudanças do nome da rua. De ‘Desvio
do Mar’ ela passou a se chamar ‘Rua Aleixo Manuel’ em homenagem a um dos
primeiros moradores da Rua. Também é registrado que, quando a Igreja Santa Cruz dos Militares foi construída (1628),
a rua ganhou o nome de ‘Rua Cruz’. Mas vocês pensam que paramos por aí? Não! A
rua também teve os nome de ‘Rua Francisco da Fonseca’, ‘Rua da Gadelha’ - esses
nomes foram entre os nomes ‘Rua Aleixo Manuel’ e ‘Rua da Cruz’ – ‘Rua Padre Homem
da Costa’ (em 1650, quando a rua foi totalmente alinhada; teria sido a primeira
grande obra), ‘Rua Moreira Cesar’ e até que, em 1760, assume o nome atual.
POR QUE RUA DO OUVIDOR?
A
história do nome ‘Ouvidor’ começa no ano de 1745, no Governo de Gomes Freire de
Andrade (conde de Bobadelha), considerado um dos principais governadores dos
tempos coloniais (segundo Varnhagem). Só para dar uma ilustração a todos, foi
esse Governador que edificou o Convento de Santa Tereza, reconstruiu o Aqueduto
da Carioca, o Chafariz do Largo da Carioca (retirado em 1926) em substituição
da antiga fonte, entre outros. Nessa época a Fazenda Real adquiriu uma casa que
foi comprada de um cidadão chamado José de Andrade para que lhe servisse de
moradia para o Ouvidor da cidade - ouvidor era uma espécie de juiz nomeado pelo
Governador Geral a fim de escutar as queixas da população.
O
primeiro Ouvidor a morar no logradouro foi Manuel Pena de Mesquita sendo o que
de verdade originou o nome da rua. O segundo ouvidor da cidade, Francisco
Berquó da Silva, foi residir no local em 1760. Daí em diante a rua passou a ser
popularmente chamada Rua do Ouvidor, mais tarde oficializada seu nome. Quando
perguntava aonde era a rua, o povo respondia:
-
Aqui é a Rua do Ouvidor, onde ele mora!
-
A Rua do Ouvidor é logo ali!
O COMÉRCIO DA RUA DO OUVIDOR
A
rua veio a sofrer uma grande transformação a partir do ano de 1808, com a
chegada da Família Real à nova capital imperial e a abertura dos Portos. Até o
ano de 1815, a rua, apesar de frequentada por uma elite, era simples, com 6,6 metros de largura e 800 metros de extensão. Em Dezembro desse mesmo ano, D. João VI
cela a paz com os franceses e isso provoca um êxodo destes que estavam insatisfeitos
com o tipo de governo de seu país, que tinha restaurado a Monarquia. Eles
movimentaram o comércio da rua, introduzindo vários artigos, principalmente aqueles
relacionados à moda. Foram abrindo lojas de roupas, cabeleireiros para senhoras,
perfumarias, cafeterias, joalherias, casas de músicas, que atraiam toda a elite
carioca. Claro que era a pequena parcela da população que possuía uma condição
para gastar nas lojas. A rua se tornou ponto obrigatório para todos aqueles que
passavam pelo centro da cidade. Era uma verdadeira atração todas aquelas lojas.
Ela
local também da elite que sabia ler, lugar de pessoas cultas, chegando a uma
determinada época ter 50 livrarias, onde políticos e intelectuais encontravam-se
para leitura e bate papo, lendo bons livros e bebendo café. Podemos considerar
a Rua do Ouvidor o primeiro “Shopping Center da Cidade”. Era o verdadeiro ”point’’
carioca.
Os
franceses introduziram ali lojas jamais vistas. Uma das mais famosas que
existia até pouco tempo era a Casa Clark (1818), que tinha famosos sapatos com
números quebrados.
Por
toda a história do Rio de Janeiro, a Rua do Ouvidor sempre foi considerada a
rua das novidades (até por que a elite se encontrava ali), que antes de serem implantadas
na cidade, eram testadas na Rua do Ouvidor.
Foi
à primeira rua apenas para pedestres - em 1829 - quando ganhou novo calçamento,
depois que um decreto do Imperador D. Pedro I proibiu a passagem de carros
puxados a boi, veículos pesados comparados aos nossos caminhões.
Foi
na Rua do Ouvidor que pela primeira vez houve a implementação do paralelepípedo
(1854). Quando houve a inovação da iluminação a gás, adivinha aonde foi? Sim,
na Rua do Ouvidor em 1854. Em 1890 chegou a iluminação elétrica. Foi a primeira
rua a ter um telégrafo (1856). Primeira rua a possuir um telefone (1877) (primeiro
telefone fabricado no Brasil). Primeira rua a possuir um cinema (1897).
Como
expliquei acima, a rua era um lugar de intelectuais e na esquina da Travessa do
Ouvidor (leva esse nome porque liga a Rua do Ouvidor à Rua Sete de Setembro)
seria fundada a Academia Brasileira de Letras pelos intelectuais Machado de
Assis e Lúcio Mendonza. Na rua foi instalada a linha de bondes puxados à tração
animal (burros). Todo o equipamento foi comprado e trazido dos Estados Unidos e
os animais eram de Sorocaba.
Fonte: Rio Antigo |
Um
detalhe bem curioso: desde 1829, a rua era apenas para pedestres, mas se abria
uma exceção no período de Carnaval para a passagem de carros alegóricos puxados
à tração animal. O que mais chama atenção é um carnaval em uma rua tão
estreita, mas claro, guardado as devidas dimensões. A festa não era uma
magnitude como os dias atuais.
Houve
uma tentativa de troca mal sucedida do nome da rua no final do século XIX. O
nome foi trocado para Rua Moreira César, nome do Comandante da expedição
organizada contra os jagunços de Antonio Conselheiro. As placas da rua foram
trocadas e passou a ser oficial, mas o povo não gostou e no boca a boca
continuavam a chamar como Rua do Ouvidor, o que obrigou o Governo a trocar
novamente para o antigo nome.
FOFOCAS NA RUA DO OUVIDOR
D. Pedro I |
Quem
não gosta de uma boa fofoca hein? Ainda mais envolvendo pessoas do alto escalão
do Governo? Desde épocas coloniais brasileiras e luso-brasileiras, a história
tem se alimentado com belos casos que entraram para as tradicionais rodas de
fofocas. De algumas que eu descobri, tem duas que vou destacar por que são
muito boas.
01.
Por decreto de D. Pedro II, a rua foi transformada apenas para pedestres -
desde 1829. Mas aconteceu uma situação inusitada com seu filho, D. Pedro II.
Pela vontade do Imperador, em 1888 a carruagem real tentou entrar na rua e um
guarda impediu a passagem. Mesmo o cocheiro identificando que ali estava a
vossa excelência, o guarda não deixou passar, obrigando a carruagem a dar a
volta.
02.
Agora a fofoca que mais apimenta nossa querida rua é as visitas de nosso
primeiro imperador, D. Pedro I às francesas que trabalhavam nas lojas. O imperador
simplesmente amava visitar a rua, constantemente sendo visto pelas redondezas,
sempre de bate papo com as balconistas francesas, sempre belas e dispostas a
agradar o imperador brasileiro. Tanto é que ali na rua ele possuiu duas amantes
e uma delas gerou um filho. Nosso imperador era “danadinho”. Foi pai aos 16
anos com a esposa do Conde da Áustria e teve seu último aos 30, com uma freira.
Por isso, além do comércio praticado na rua, nosso imperador sempre estava
pelas redondezas, sempre atrás de um bom “rabo de saia”.
RUA DO OUVIDOR NO SÉCULO XX
A
Rua do Ouvidor no início dos anos 1900 era chamada de “beco de luxo, estreito e
sinuoso”. Possuía 313 prédios nos quais a elite comprava tudo de importado que
precisavam para “ostentar” sua posição na sociedade.
Confeitarias
abertas entre a Rua do Ouvidor e a dos Ouvides (atual Miguel Couto) alegravam a
alta classe depois de um dia de compras nas mais belas lojas como a de chapéus
Watson – os homens adoravam usar chapéus – e a loja Falais Royal.
Segundo
o jornalista da época Luiz Edmundo, a Rua do Ouvidor era o centro da moda
carioca, o verdadeiro lugar para observar e comprar as tendências usadas na
Europa. Sendo que as obras promovidas pelo prefeito Pereira Passos (1902-1906) modificaram
muito a paisagem da rua. Prédios foram demolidos e deram lugar a construções
mais modernas. Com a construção e a inauguração da Av. Central (1905), a rua
começou a perder seu charme, pois a nova avenida veio ocupar o espaço de lugar
luxuoso e das principais lojas da cidade. Mas seu glamour continuou e seu
centro de comércio ainda bem movimentado.
Nos
dia de hoje, a rua é toda comercial. Em uma boa parte dela existem lojas de
todos os tipos de produtos, e uma pequena parte dela, depois que ela é cortada
pela Rua Primeiro de Março, é lugar de encontro de trabalhadores cansados de
uma semana estressante, bares e restaurantes de música ao vivo e transmissão de
jogos; local típico que todo o carioca gosta, ficando lotado nos finais de
semana.
PONTOS TURÍSTICOS
A
Rua do Ouvidor pode ser considerada toda turística até pela história que a
ronda. Entretanto, destaquei aqui dois principais para que possamos ver o
quanto ela é importante para o Rio de Janeiro.
01.
Igreja Nossa Senhora da Lapa dos Mercadores
Está
situada na Rua do ouvidor número 35 e faz esquina com a Travessa do Comércio. O
templo foi erguido como um pequeno oratório em 1743 pelos comerciantes e
moradores das redondezas em uma casa na esquina da Rua Cruz - atual Rua do
Ouvidor (o oratório era onde hoje está a Igreja de Santa Cruz do Militares). Esse
oratório foi erguido à invocação de Nossa Senhora da Lapa dos Mercadores. Pouco
tempo depois, em 1747, os comerciantes se reuniram e fundaram uma irmandade para
edificação de um templo para a Santa, também conhecida como “Igreja dos Mercadores”.
No dia 4 de novembro do mesmo ano foi lançada a pedra fundamental para o
templo. As obras andaram rápidas (por que será hein!? Mercadores, comércio), de
modo que no dia 6 de agosto de 1750 o templo ficou pronto - um recorde para a
época - e foi logo depois consagrado. Até o ano de 1766 foram finalizadas
coisas menores. Mas o que importava era que a estrutura principal estava pronta.
Entre os anos de 1869 e 1879 o templo sofreu grande e extensas reformas para o
conservar em melhor estado.
Mas
o fato curioso aconteceu no dia 25 de setembro de 1893. Nesta data foi quando
eclodiu a Segunda Revolta da Armada Brasileira. Um tiro de canhão foi disparado
pelo encouraçado Aquidabã da Baía de Guanabara atingindo a região onde estava a
estátua da santa, que sofreu uma queda de 25 metros de altura e apenas quebrou
um pequeno pedaço. Na época, isso foi considerado um verdadeiro milagre e o
culto à Santa começou a crescer assustadoramente.
Tanto
o projétil quando a Santa estão expostos na sacristia da Igreja.
02.
Igreja Santa Cruz dos Militares
Fica
na esquina da Rua do Ouvidor, na Rua Primeiro de Março, tendo sua frente virada
para a rua. Ela foi construída na época do Rio colonial, no qual existia um
forte de defesa da cidade, erguido em 1605, mas que em 1623 encontrava-se em
ruínas. Nesse ano se iniciou a construção da Igreja de Vera Cruz, sendo
concluída e inaugurada em 1628. Era local de oração usado por aqueles que
guardavam as defesas de nossa cidade.
Posteriormente,
no Largo do Carmo, eram realizadas as manobras militares – que era próximo à
Rua do ouvidor. Este foi o local escolhido, em 1770, para a construção da
Igreja de Santa Cruz dos Militares, onde existia o forte e a outra igreja.
Entre os anos de 1780 e 1811, o templo foi totalmente reconstruído, tornando-se
uma irmandade imperial por decreto de D. Pedro I, seu provedor, em 1828. Em
1914 a igreja foi totalmente reformada devido a um incêndio. Vale ressaltar que
as ruínas do forte ainda existem onde é hoje a esquina da Rua Primeiro de Março
e Rua do Ouvidor. A irmandade Santa Cruz ergueu a Capela de Santa Cruz. Antes
da ruína do local, a guarnição solicitou que ali fosse transformado em cemitério
para os militares. Um detalhe: a igreja original era toda decorada pelo mestre
Valentim.
Igreja Santa Cruz dos Militares |
Imperador D. Pedro II |
BIBLIOGRAFIA
CARVALHO,
de Delgado: História da cidade do Rio de Janeiro. 2. Ed. Rio de Janeiro:
secretária Municipal de Cultura e Turismo, 1990
FREIRE,
Américo: Guerra de posições na metrópole: a prefeitura e as empresas de ônibus
no Rio de Janeiro (1906-1948). 1. Ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2001
PASSEIO com o professor Milton Teixeira.
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Autor do Artigo: Paulo Silva
(Acadêmico em História | Co-Criador do Blog | Técnico em Enfermagem)
Contato: paulojorgest200213@gmail.com
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